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Belo Monte e o estado parceiro


Escrito por beatriz,

Roberto Pereira d’Araujo


De 1995 até agora o Brasil passou por uma mudança profunda em seus serviços públicos. Embora muitos ainda considerem que foi uma “reforma incompleta”, já é possível tirar algumas lições. Qualquer análise séria não pode deixar de reconhecer que, apesar das premissas, a privatização não trouxe muitas prometidas melhorias para a sociedade brasileira. Os exemplos ilustrativos são muitos. Os casos Light, Ampla, Barcas, Eletropaulo, Supervia, e algumas estradas pedagiadas são exemplos emblemáticos. O sempre citado contra-exemplo das telecomunicações, convenientemente, esquece o fato de que esse setor passou por uma radical revolução tecnológica que, muito provavelmente, também teria acontecido sob gestão estatal.

Mas o foco desse artigo não é absolutamente a defesa da gestão estatal. Pelo contrário, é preciso reconhecer que as empresas usadas como “moeda de troca” numa política de “governabilidade” pouco transparente perderam ainda mais a sua já decaída eficiência. Perante esse confuso quadro, o que é espantoso é que o termo “estatismo” continua tão pejorativo quanto antes para os analistas econômicos. No Brasil, a alusão às atividades de estado diferentes das básicas ainda soam como um “perigoso socialismo”. De nada adiantam os exemplos dos países desenvolvidos onde nem tudo é privado. 

Ora, para ser correto, é preciso admitir que, sob o atual cenário, não sabemos nem privatizar e nem gerir empresas públicas. A atuação das agências reguladoras tem se mostrado bastante distante dos interesses dos consumidores. Parecem ter sido criadas sob a égide de contratos de concessão que, de tão “sagrados”, ousam desafiar até mesmo a aritmética. São ferozes guardiãs desses “instrumentos jurídicos perfeitos” não importando as conseqüências e nem o espírito do serviço público.

Agora, o caso Belo Monte vem tornar ainda mais evidente o tipo de estado que estamos construindo. Trata-se do estado “parceiro”. “Parceria” já é um termo que não combina com a visão “antagonista” dos que ainda clamam pelo fantasma do estatismo. Pior ainda, a parceria não é com a sociedade brasileira. Ela se faz com empresas privadas sob a tortuosa lógica de que o efeito indireto dessa “sociedade” é benéfico à população em geral.

Não bastaram os empréstimos do BNDES a juros subsidiados (uma vez que são inferiores à taxa de captação do governo) que desafiam qualquer princípio de isonomia. Não bastaram as isenções fiscais que jogam nas costas do contribuinte parte do custo da obra. Ainda foi necessária a participação de uma empresa estatal, a CHESF, que entra no negócio da usina como minoritária e sob um contrato de consórcio com nenhuma transparência.

Não pensem que o caso Belo Monte inaugura essa atitude “servil” do estado parceiro. Nos leilões de linhas de transmissão, onde essa prática foi largamente adotada, as reações dos “sem parceria” denunciam, no mínimo, a falta de isonomia.

O Jornal Folha de São Paulo do dia 13/02/2007 publica a seguinte declaração do Sr. Claudio Salles, presidente do Instituto Acende Brasil:


De nada adianta uma regra de leilão perfeita se você não tem como assegurar que todos os competidores agirão pela mesma lógica de racionalidade econômica’, disse Sales, ao comentar que algumas estatais “se conformam com taxas de retorno que sequer remuneram o capital investido.


O Valor Econômico de 13/03/2008, o mesmo representante:

Para o presidente do Acende Brasil, não há vantagens nas novas regras, mas sim um potencial desestímulo a investimentos privados. Um grande concessionário de hidrelétrica, que pediu para não ter seu nome divulgado, teme a entrada das subsidiárias da Eletrobrás nos próximos leilões de geração com tarifas muito baixas, para forçar uma queda de preços, com taxas de retorno excessivamente baixas. É o que ele classifica de competição predatória, negada pelo ministro.


O que o setor privado reclama é perfeitamente justo. Já que é assim, parceria para todos!

Sob esse quadro, chega às fronteiras do ridículo qualquer alusão a certo “chavismo” do atual governo. Enquanto lá o estado expulsa empresas, aqui se desdobram os tapetes vermelhos. Pelo jeito, ainda são insuficientes.

Roberto Pereira d’Araujo

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