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- Por que os Direitos Humanos ainda são uma Utopia (e por que devemos Lutar por Eles)
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 10 de dezembro de 1948, nasceu como um gesto civilizatório diante da barbárie. Era, ao mesmo tempo, o testemunho do horror que a humanidade fora capaz de produzir e a promessa de que nunca mais aceitaria conviver com ele. Contudo, mais de sete décadas depois, é impossível não reconhecer que aquela promessa, embora luminosa, permanece em estado de suspensão. Entre o ideal inscrito nos 30 artigos da Declaração e a realidade concreta vivida por populações racializadas, periféricas e vulnerabilizadas — especialmente no Brasil — abre-se um abismo que não é mero acidente histórico, mas resultado de uma arquitetura política que administra a vida e produz a morte. 1. A herança universalista e o limite da promessa humanista O humanismo jurídico do pós-guerra acreditava que bastava nomear direitos para que eles existissem. A palavra teria poder performativo capaz de instaurar, por si só, um novo horizonte civilizacional. Hannah Arendt, lendo os deslocamentos forçados e a figura do apátrida, já advertia: os direitos humanos são frágeis quando não são garantidos por uma comunidade política disposta a defendê-los. “O direito a ter direitos” — sua formulação célebre — apontava para uma tensão que ainda nos atravessa: direitos só são universais se forem igualmente reivindicáveis e igualmente protegidos. Não é o caso. Mesmo a própria Declaração de 1948 emerge de um mundo profundamente assimétrico. Impérios coloniais ainda vigoravam; a segregação racial nos Estados Unidos era lei; e, no Brasil, a fábula da democracia racial mascarava mecanismos robustos de exclusão. A universalidade, desde o início, esteve impregnada por uma epistemologia branca, europeia e masculina — um universal que se toma por neutro, apagando as violências que o fundam. É justamente este terreno que a Revista Amefricana pretende tensionar: pensar os direitos não a partir do universal abstrato, mas da experiência concreta dos povos que historicamente lutaram para serem reconhecidos como humanos. 2. Do biopoder à necropolítica: quando o Estado decide quem pode viver Se Foucault apontou o biopoder como a lógica moderna de gestão da vida, Achille Mbembe atualizou o diagnóstico ao nomear o que muitos países do Sul Global experienciam: a necropolítica — o governo pela morte. Nessa lógica, o Estado não apenas administra a vida; ele decide, de maneira ativa, quem pode morrer, quem pode matar e quais vidas são descartáveis. Poucos contextos ilustram esse paradigma com tanta nitidez quanto o Brasil contemporâneo. Aqui, a distância entre o texto da Declaração e a realidade é medida em corpos negros, indígenas, favelizados, encarcerados, deportados ou silenciados. O direito à vida, proclamado como inviolável no Artigo 3º, é rotineiramente violado pelo próprio Estado que deveria garanti-lo. O direito ao trabalho, à moradia, à saúde e à proteção contra tortura e discriminação torna-se letra morta em territórios onde a precariedade é normalizada. A necropolítica brasileira opera de maneira racializada: não se trata apenas de matar, mas de permitir morrer; não se trata apenas de violência direta, mas de abandono programado. Como lembra Sueli Carneiro, vivemos sob a vigência de um “humanismo amputado”, onde a plenitude da humanidade é distribuída de forma desigual. 3. Direitos que não chegam ao chão: a contradição brasileira Nenhum país assinou tantos compromissos internacionais de direitos humanos quanto o Brasil. Somos signatários de tratados, pactos, convenções e recomendações. Fizemos do vocabulário dos direitos uma espécie de gramática estatal. Contudo, como bem demonstra a literatura crítica brasileira — de Abdias Nascimento a Lélia Gonzalez, de Silvio Almeida a Déborah Duprat — a distância entre norma e prática não é incapacidade: é projeto. Três tensões estruturam essa contradição: a) A colonialidade do poder A lógica racial fundante da sociedade brasileira continua informando as instituições. O Estado opera com hierarquias herdadas do período escravocrata, que se atualizam na seletividade penal, na distribuição desigual da violência e no racismo institucional. b) A moralização da desigualdade Direitos, no Brasil, são frequentemente narrados como privilégios. O discurso reacionário insiste que defendê-los é defender “bandidos”, “militantes” ou “minorias barulhentas”. Essa inversão moral busca esvaziar a própria legitimidade da luta coletiva. c) A governança pela precariedade A ausência de políticas públicas consistentes não é falha administrativa; é o modo de funcionamento que mantém populações inteiras numa zona cinzenta de semi-direitos, sempre negociáveis, sempre instáveis. 4. Por que os direitos ainda são uma utopia? Não porque sejam inalcançáveis, mas porque a sua realização plena exige ruptura, e não apenas reforma. Exige repensar quem produz conhecimento, quem define o humano e quem narra a própria história. É nesse ponto que a Revista Amefricana se torna não apenas um espaço editorial, mas um gesto político. Ela se coloca como dispositivo de soberania epistêmica, disputando o que entendemos por humanidade, por dignidade e por justiça. Ao centrar vozes negras, indígenas, amefricanas e periféricas, a revista desloca o eixo da análise: os direitos não são apenas normas jurídicas; são práticas de mundo, experiências de resistência, insurgências cotidianas. 5. A utopia necessária: o trabalho da esperança Se os direitos humanos ainda são utopia, não é porque falhamos. É porque ainda estamos em luta. A utopia, aqui, não é horizonte inatingível; é motor ético que impede a naturalização da violência. Lutar por direitos humanos é: recusar a pedagogia da indiferença; desmascarar os projetos de morte; participar da disputa pública sobre o valor das vidas; construir epistemologias que tornem visíveis aqueles que o Estado tenta apagar; reencantar o mundo com a possibilidade de justiça. Como lembra Paulo Freire, a esperança não é espera: é anúncio e denúncia. Denúncia da violência estrutural; anúncio de que viver plenamente é um direito — e não um privilégio. 6. Conclusão: o gesto de dizer “humanidade” Celebrar o Dia Internacional dos Direitos Humanos não é repetir slogans; é encarar o espelho da nossa própria brutalidade. No Brasil, onde a democracia é constantemente testada pela lógica da morte, defender direitos humanos é um ato de insurgência moral. Ainda que permaneçam como utopia, são justamente eles que permitem imaginar outro país — e, ao imaginá-lo, começar a construí-lo. Entre o mundo que temos e o mundo que podemos ter, há uma ponte feita de palavras, corpos e lutas. Que a Revista Amefricana seja uma dessas pontes.
- Guia de Presentes Pandora: 10 Livros para Quem Quer Mudar o Mundo (e a Si Mesmo)
Dar um livro nunca é apenas dar um objeto. É oferecer um gesto político, uma convocação afetiva e, sobretudo, um horizonte. No universo da Livraria Pandora, onde cada título é selecionado como quem escolhe uma ferramenta de transformação, presentear com um livro significa reconhecer no outro a potência de pensar, sentir e intervir no mundo. Por isso, ao prepararmos este Guia de Presentes, partimos da certeza de que uma boa leitura não é um mero "mimo" de Natal — é um convite à mudança. É um pacto silencioso de confiança: “Eu acredito no que você pode se tornar quando este texto te tocar.” Em um país em que a disputa pelo imaginário é central, presentear com obras que desestabilizam narrativas coloniais, iluminam subjetividades negras e afirmam a potência de outros mundos possíveis é, também, um ato de insurgência. Cada título listado abaixo não é apenas uma indicação de leitura; é uma semente de futuro embrulhada em papel. Preparamos uma seleção estratégica, entre clássicos indispensáveis e contemporâneos urgentes, que dialogam diretamente com o antirracismo, a crítica cultural, o afeto e a decolonialidade. Top 10: Uma Curadoria de Afeto e Luta 1. Um Defeito de Cor — Ana Maria Gonçalves Um romance monumental que reescreve a história do Brasil a partir da voz de Kehinde, uma mulher negra que atravessa o Atlântico e o século XIX em busca de liberdade e de seu filho. Por que presentear: É o livro da década. Uma leitura que descentraliza o olhar colonial e reconstrói nossa identidade. Quem lê, não sai o mesmo. Perfil: Para quem ama narrativas densas, de envergadura épica e profundamente humanas. 2. Tudo Sobre o Amor: Novas Perspectivas — Bell Hooks hooks nos devolve ao óbvio esquecido: o amor é uma prática ética e política. Ao retirar o amor do campo do romance patriarcal, ela nos convida a uma responsabilidade afetiva comunitária. Por que presentear: Para quem vive um fim de ano de balanço emocional. É cura, é respiro, é política dos afetos. Perfil: Ideal para quem busca autoconhecimento sem perder o rigor crítico. 3. Por um Feminismo Afro-Latino-Americano — Lélia Gonzalez A obra que reúne os textos fundamentais daquela que redefiniu nossa geografia. Aqui estão as bases da Améfrica Ladina e do pensamento radical sobre raça, gênero e linguagem. Por que presentear: É a espinha dorsal da nossa nova Revista Amefricana. Um marco teórico incontornável para entender o Brasil. Perfil: Para estudantes, militantes e qualquer pessoa que deseje ler o país sem as lentes da branquitude. 4. Pele Negra, Máscaras Brancas — Frantz Fanon Fanon disseca o racismo não apenas como estrutura social, mas como violência psíquica e existencial. O texto fundante da teoria decolonial. Por que presentear: É um "despertador teórico". Após lê-lo, torna-se impossível ver as relações raciais com ingenuidade. Perfil: Para psicólogos, cientistas sociais e quem deseja entender o impacto subjetivo do racismo. 5. Olhos D’água — Conceição Evaristo Contos curtos e contundentes, atravessados pela escrevivência: a escrita que nasce da vida, das dores e das potências das mulheres negras no cotidiano. Por que presentear: É literatura que abraça e fere — e é justamente essa honestidade que a torna vital. Perfil: Para amantes de ficção que emociona e conecta com a realidade brasileira. 6. Ideias para Adiar o Fim do Mundo — Ailton Krenak Com precisão cirúrgica e poesia, Krenak questiona a lógica do "progresso" e nos convoca a imaginar modos de vida que não devorem a Terra. Por que presentear: É um livro curto, mas infinito. Rápido de ler, impossível de esquecer. Perfil: Para quem pensa o futuro, a ecologia e os limites do capitalismo. 7. Memórias da Plantação — Grada Kilomba Kilomba articula teoria pós-colonial e psicanálise para mostrar, através de episódios cotidianos, como o racismo estrutura a linguagem e os silêncios. Por que presentear: É uma porta de entrada poderosa e acessível para a teoria crítica contemporânea. Perfil: Para leitores que buscam entender o racismo cotidiano com profundidade teórica. 8. O Genocídio do Negro Brasileiro — Abdias do Nascimento Abdias desmonta o mito da democracia racial e expõe o projeto histórico de eliminação simbólica e material da população negra. Por que presentear: Traz dados, argumentos e historicidade. É municiamento intelectual puro. Perfil: Para ativistas, debatedores e formuladores de políticas públicas. 9. Pedagogia do Oprimido — Paulo Freire Mais do que um livro sobre escola, é um tratado sobre como ler o mundo para transformá-lo. Freire nos ensina que educar é um ato político. Por que presentear: É uma chave de leitura para compreender a esperança como verbo, não como espera. Perfil: Professores, educadores, gestores e sonhadores pragmáticos. 10. Pequeno Manual Antirracista — Djamila Ribeiro Djamila traduz conceitos complexos de forma didática e direta, oferecendo um guia prático para reconhecer e enfrentar o racismo estrutural. Por que presentear: É o presente perfeito para quem está iniciando a jornada. Um convite amigável, mas firme, à responsabilidade. Perfil: Para amigos, colegas ou parentes que precisam dar o primeiro passo. O Presente Perfeito é o que Abre Caminhos O presente mais valioso não é o mais caro: é aquele que expande a visão. E poucas coisas abrem mais caminhos do que um bom livro. Para tornar este gesto ainda mais significativo, a Livraria Pandora preparou uma oferta que expressa nosso compromisso com o acesso: 🎁 A Magia da Escolha : Comprando qualquer combinação destes livros (ou outros do site) acima de R$ 99,00, você escolhe um outro LIVRO GRÁTIS de nossa seleção especial. 💰 O Presente que Volta : Lembre-se: TODA compra gera Pandora Cash para suas leituras de 2026. É mais do que uma promoção: é uma política de incentivo à leitura crítica. Conte conosco para mudar o mundo, uma página por vez.
- Nasce a Revista Amefricana: da Curadoria à Soberania Epistêmica
A Livraria Pandora sempre entendeu que um livro não encerra uma jornada; ele inaugura uma travessia. Ao longo de nossa trajetória, atuamos como curadores de pensamento, selecionando obras que alimentam o espírito crítico, tensionam as estruturas e abrem fendas no senso comum. Mas o tempo histórico que atravessamos nos convoca a algo maior. Não basta circular o que já foi pensado. É preciso participar ativamente da gestação de novos paradigmas, novas linguagens e novas formas de existir e resistir. Chegamos, assim, a um ponto de inflexão. É hora de deixar a posição confortável de consumidores de teoria e assumir a responsabilidade de produzir conhecimento desde os lugares que habitamos — geográficos, raciais, epistemológicos e afetivos. Se, até aqui, a Pandora foi uma estante generosa, agora ela se torna tribuna. Com profundo compromisso ético e alegria política, anunciamos o nascimento de nosso braço acadêmico e científico: a Revista Amefricana . Por que "Amefricana"? Um Batismo Político “Amefricana” não é apenas um nome. É um gesto. É um deslocamento epistêmico inspirado na potência intelectual de Lélia Gonzalez, que ousou reconfigurar a cartografia das ideias ao nomear nossa condição histórico-cultural como Améfrica Ladina. Ao adotarmos essa identidade, recusamos o enquadramento da “América Latina” enquanto categoria que privilegia a continuidade colonial europeia e desconsidera os eixos estruturantes da racialidade que formaram este território. Assumimo-nos, portanto, como fruto das encruzilhadas entre a diáspora africana, os povos originários e as tensões do Sul Global. A Revista Amefricana nasce para ser um espaço onde saberes negros, indígenas, populares e periféricos não precisem pedir licença para existir. Aqui, o Pretuguês não é exceção, mas horizonte. Nosso compromisso é com a soberania epistêmica . Sociologia, Desenvolvimento e Práxis: Rompendo a Dicotomia O campo editorial científico vive, há décadas, preso a uma falsa dicotomia: de um lado, o academicismo hermético, isolado em sua torre de marfim; de outro, o tecnicismo da gestão pública sem imaginação política. A Revista Amefricana nasce para romper essa clivagem. Nosso subtítulo — Sociologia, Desenvolvimento e Práxis Antirracista — expressa nossa metodologia de trabalho. Buscamos uma síntese dialética entre rigor teórico e ação transformadora. Queremos publicar pesquisas que articulem a Teoria Crítica (capaz de revelar as estruturas invisíveis) com a Gestão Pública e o Direito (campos que materializam as disputas por reparação). Propomos uma revista onde se discuta o orçamento público e o racismo estrutural na mesma página; onde se investigue o encarceramento em massa à luz das teorias decoloniais. Buscamos uma ciência encarnada, insurgente e útil às urgências do nosso tempo. Um Quilombo Intelectual de Acesso Aberto Vivemos a era da mercantilização do saber, onde o conhecimento é trancado atrás de muros de pagamento (paywalls). A Revista Amefricana nasce como um ato de desobediência epistêmica frente a esse modelo. Nosso compromisso é radical: seremos um periódico de fluxo contínuo, totalmente digital e 100% Open Access . Acreditamos na Justiça Cognitiva . O acesso ao conhecimento é um direito, não um privilégio. Queremos ser um quilombo intelectual, onde o conhecimento circula livre, seguro e fecundo, incentivando pesquisas de autores emergentes, negros, periféricos e de grupos historicamente excluídos do cânone editorial. Nosso Norte é o Sul Neste momento fundacional, estamos constituindo nosso Conselho Editorial , convidando intelectuais cuja trajetória combina excelência acadêmica e sensibilidade decolonial. Abrimos a chamada para o cadastro no nosso Banco de Pareceristas e, em breve, lançaremos nossa primeira Chamada de Artigos . Inspirados no gesto cartográfico de Joaquín Torres García, que desenhou a América de cabeça para baixo para revelar seus centros deslocados, afirmamos: nosso Norte é o Sul . Se até aqui a Livraria Pandora foi guardiã de livros, agora ela se afirma como editora de futuros possíveis. Convidamos você a atravessar esta porta conosco. Bem-vindos à Revista Amefricana . Aqui, a teoria se compromete com a vida — e a vida exige ação.






