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Pedagogia do Afeto: A educação que cuida, segundo Paulo Freire

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Celebrar Paulo Freire como Patrono da Educação Brasileira é reconhecer uma pedagogia que, acima de tudo, prioriza a escuta e o diálogo. Sua obra nos lembra que educar é um gesto profundamente humano: um ato de cuidado com o outro, que juntos constroem a possibilidade de um mundo mais justo. O legado freiriano não se resume a métodos ou inovações acadêmicas, mas é um convite para vivermos uma educação que seja, simultaneamente, libertação e afeto.

Uma educação que oprime não só limita o pensamento crítico, mas também fere o espírito humano. Uma escola organizada pelo silêncio e pelo medo se transforma em um lugar de dor. O aluno que se cala diante do autoritarismo não perde apenas a voz; ele perde a chance de se reconhecer como um sujeito digno. Como Freire nos lembra em Pedagogia do Oprimido: "Ninguém pode ser autenticamente humano proibindo os outros de também o serem." Cada voz sufocada é uma negação da humanidade e uma cicatriz coletiva.

Paulo Freire nos aponta em outra direção. Para ele, a educação é uma prática da liberdade porque é uma prática de encontro: encontro com a própria história, com a cultura, com a comunidade e com a esperança. É nesse movimento que o ato de educar se torna também um ato de cuidado. O cuidado, em sua pedagogia, é o reconhecimento da dignidade do outro, a afirmação de que ninguém é inferior ou incapaz de pensar, sentir e transformar. Em lugar do medo, a confiança; em lugar da passividade, a autonomia; em lugar da solidão, a comunidade. Como ele escreveu em Pedagogia da Autonomia: "Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção."

A pedagogia de Freire é, em seu sentido mais profundo, uma pedagogia do afeto. Não um sentimentalismo vazio, mas a convicção de que o amor é uma categoria política. Para Freire, amar é comprometer-se radicalmente com a libertação do outro e não se conformar com a desumanização. Em Pedagogia do Oprimido, ele afirma: "O amor é um ato de coragem, não de medo; o amor é compromisso com os homens." Quando um professor olha para seus alunos não como recipientes a serem preenchidos, mas como sujeitos com histórias, dores, sonhos e saberes, ele não apenas ensina, ele cuida. E esse cuidado é, por si só, um ato de cura.

Em um tempo em que a saúde mental é uma preocupação central, essa conexão entre pedagogia e bem-estar se torna ainda mais necessária. O estudante que se sente respeitado e pertencente a um processo dialógico encontra um antídoto contra a solidão e a desesperança. Em Pedagogia da Esperança, Freire diz: "A desesperança nos imobiliza e nos faz sucumbir ao fatalismo, enquanto a esperança nos impulsiona a lutar e a sonhar." O espaço educativo, quando pautado na visão freiriana, se transforma em um lugar de acolhimento e partilha, onde se aprende não apenas a ler o mundo, mas a ressignificar feridas e a construir laços de solidariedade.

A pedagogia libertadora não ignora os conflitos, mas os acolhe como parte da vida. O confronto de ideias, a tensão entre experiências e o choque de visões de mundo, quando mediados pelo diálogo e pelo respeito, deixam de ser fonte de sofrimento e se transformam em motor de crescimento coletivo. Afinal, como Freire nos ensina: "Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão." Nesse encontro, educar deixa de ser um ato solitário e se torna uma experiência comunitária de cura.

Educar, portanto, é muito mais do que preparar para provas ou para o mercado de trabalho. É cultivar o humano no ser humano. É estender a mão, ouvir, reconhecer a dor, celebrar a alegria e fortalecer a esperança. É, em essência, afirmar que a escola não pode ser um espaço onde os sonhos morrem, mas onde as possibilidades nascem.

Honrar Paulo Freire é reafirmar que toda verdadeira educação deve ser libertadora e amorosa. É uma educação que cura não porque elimina os desafios, mas porque nos ensina a enfrentá-los juntos, com coragem e dignidade. Ao praticarmos a pedagogia do afeto, cuidamos não apenas de mentes que aprendem, mas de corações que sonham e de corpos que resistem. E é nesse encontro entre liberdade e cuidado que a educação revela sua mais bela missão: ser a ponte para um mundo em que todos são visíveis e podem viver com dignidade, e em que aprender é, também, um ato de curar e de cuidar.

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